quinta-feira, 25 de abril de 2024

Uma reforma política à lá Frank Underwood – por Tiago Ayres

Já não é mais novidade a comparação que, vez ou outra, se faz entre  Eduardo Cunha, o presidente da Câmara dos Deputados, e o fictício Frank Underwood, da série mundialmente conhecida House of Cards, político implacável, com extraordinária capacidade de, por meio de questionável manipulação, atingir os seus objetivos.

Se havia alguma dúvida quanto a essa semelhança, a edição do “The Economist” de 07 de fevereiro de 2015 parece tê-la afastado. Intitulado “Aliados incômodos”, o texto da mencionada  publicação britânica aborda a “vida difícil” que o peemedebista deve impor a Dilma Rousseff no comando da Câmara.

Mas nada parece aproximar mais o deputado Eduardo Cunha da figura de Frank Underwood do que as suas declarações e posicionamentos quanto a um dos temas mais relevantes para o país: a reforma política.

Não obstante a necessidade de sério e aprofundado debate sobre essa reforma que alterará substancialmente as  regras do jogo democrático, o presidente da Câmara tem demonstrado invulgar disposição para realizar a reforma política, custe o que custar.

A Comissão especial de reforma política foi criada para ser concluída em 40 sessões, estando em sua pauta temas delicadíssimos, tais como o instituto do voto facultativo, o financiamento público de campanha, a adoção do sistema distrital, a criação da figura do “recall”, o fim das coligações, dentre outros assuntos espinhosos.

Evidente, portanto, que seria algo absolutamente nocivo à democracia a deliberação aligeirada sobre esses importantes aspectos da reforma. Uma reforma política à lá Frank Underwood, poderia apenas reforçar as fragilidades do sistema político.

Eduardo Cunha parece, entretanto, estar disposto  a fazer a sua reforma da forma e no tempo que lhe convier, revelando pouco caso para com a imprescindibilidade de ampliação dos debates.

Assim é que já sentenciou: “quando acabar – o prazo para conclusão do trabalho da Comissão especial – , se não tiver votado, eu vou avocar para o Plenário, levarei para o Plenário votar de qualquer maneira, com ou sem o parecer da Comissão, ou seja, nós vamos votar”.

Parece que o “The Economist”acertou na comparação entre Frank Underwood e Eduardo Cunha. A única diferença é que, enquanto na ficção nos deliciamos com a bem escrita trama “House of Cards”, na vida real suportamos os duros efeitos das ações de um presidente da Câmara que parece ter levado a sério demais o seu desejo de brincar de Frank.

Tiago Ayres é advogado, mestre em Direito Público pela UFBA, professor da Pós-graduação em Direito Público da Faculdade Baiana de Direito e sócio do Escritório Ayres e Catelino Advogados Associados. Ele escreve às terças-feiras no Toda Bahia sobre temas relevantes do Direito. E-mail: tiago.ayres@gmail.com

05 de maio de 2015, 00:05

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