sexta-feira, 19 de abril de 2024

Trinta anos sem Borges – por Paulo Alencar

DE BUENOS AIRES – Por ocasião dos 30 anos da morte do escritor argentino Jorge Luis Borges, a revista do jornal “La Nación”, de Buenos Aires, dedicou no domingo passado (12/06) mais de uma dezena de páginas ao escritor. O que mais me chamou a atenção, além das fotos de época, foram quatro passagens que mostram Borges sendo Borges no seu melhor.

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Na primeira delas, Borges encontra certa vez Peralta Ramos e o diálogo ocorreu assim:

– Você deve ser parente de Cotita Peralta Ramos…

– Não. Sou o pintor, o escultor, o poeta, o cantor e o trovador Federico Manuel Peralta Ramos.

– Caramba, como eu gostaria de ser alguma dessas coisas.

De outra vez, num café da capital argentina, um homem chega para Borges e diz:

– Eu faço música de protesto.

– Como o admiro. Eu não me animo nunca a protestar.

Roberto Altifano, que durante dez anos foi uma espécie de secretário, escudeiro e amigo de Borges, recorda que um jovem seminarista e professor de Literatura chamado Jorge Bergoglio visitava de vez em quando o escritor, no seu apartamento da Calle Maipú. O hoje Papa Francisco pedia a Borges para dar uma aula no colégio onde ele ensinava. Borges chegou a comentar com Altifano:

– Tem um jesuíta que está empenhado em ensinar minha poesia em suas aulas de Literatura. Ainda não consegui dissuadi-lo. Com ele podemos falar de muitas coisas. Mas também tenho notado e é alarmante que tenha tantas ou mais perguntas do que eu.

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Na tarde do dia 27 de novembro de 1985, véspera de sua partida da Argentina, Borges foi conduzido de carro para a exposição onde estariam à venda as primeiras edições de suas obras. No trajeto, houve muitas brincadeiras e a motorista foi sincera ao dizer que nunca havia lido uma obra dele.

Já considerado em vida o maior escritor argentino. Borges simplesmente respondeu:

– Felicito-a por sua sinceridade. As pessoas geralmente inventam. Que bom que tenha feito assim.

Como se sabe, Jorge Luis Borges morreu em 14 de junho de 1986, em Genebra, na Suíça, e foi enterrado a poucos metros da tumba de João Calvino.

17 de junho de 2016, 07:00

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