quinta-feira, 25 de abril de 2024

Filiação partidária e janela migratória na minirreforma eleitoral – por Tiago Ayres

Como se sabe, no dia 29 de setembro de 2015, a presidente Dilma Rousseff sancionou a Lei 13.165/2015, norma introdutória de diversas inovações no direito eleitoral. Entre as mudanças apresentadas, merecem especial atenção as alterações nos prazos para filiação partidária e a nova hipótese de mudança de partido sem configuração de infidelidade partidária.

A reforma eleitoral altera o prazo mínimo de filiação partidária para participação nas eleições. De acordo com a regra prevista pela nova redação do art. 9º da Lei 9.504/1997, para concorrer aos próximos pleitos eleitorais, o candidato deverá estar filiado ao grêmio político, no mínimo, até 6 (seis) meses antes da eleição. Antes da Lei 13.165/2015, o prazo era de 1 (um) ano. A inovação mencionada não altera o prazo mínimo de domicilio eleitoral, que permanece sendo de 1 (um) ano antes do pleito.

A propósito, vale esclarecer que a noção de domicílio eleitoral é mais larga e flexível do que a de domicílio civil, não sendo marcado pela rigidez do art. 70 do CC, em que se diz ser domicilio da pessoa natural o lugar em que esta reside com ânimo definitivo. O domicilio eleitoral pode ser qualquer local com o qual a pessoa mantenha laços materiais ou até mesmo afetivos, comunitários, empresariais, políticos, patrimoniais, familiares e profissionais.

Com relação aos candidatos detentores de mandato político, cabe destacar aqui a inovação trazida pelo inciso III, do artigo 22-A da Lei 9.096/95. De acordo com esta nova disciplina normativa, não perderá o mandato eletivo aquele que mudar de partido nos 30 (trinta) dias que antecedem o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição ao término do mandato vigente.

Tal previsão, diferentemente do que alguns defenderam, de nada tem de inconstitucional. Como temos afirmado há alguns anos, não é acertado confundir-se fidelidade partidária com aprisionamento partidário. O ordenamento jurídico eleitoral parece agora ter capturado essa ideia. Assim, enquanto estiver no exercício do mandato, o representante – eleito por um determinado partido – deverá honrar com o seu dever de fidelidade.

Entretanto, agora é assegurado ao mandatário, já ao final do prazo de filiação partidária, a avaliação do partido no qual se encontra enfileirado, não podendo ficar aprisionado a uma agremiação partidária quando a própria comunidade espera dele uma mudança. Esta previsão legal tem sido denominada de “janela partidária” e trata-se de uma possibilidade de troca de partidos sem a punição da perda do mandato por infidelidade partidária. Com base nesta possibilidade, a indicação é que todos os candidatos que estejam exercendo mandato eletivo e desejem alterar sua legenda, só o façam dentro do prazo permitido por lei, evitando, assim, a perda de mandato desnecessariamente.

Caso o filiado que exerça cargo eletivo queira mudar para outra agremiação partidária fora dos trinta dias anteriores ao prazo de 6 (seis) meses, deverá provar, por meio de ação de declaração de justa causa, o preenchimento de pelo menos um dos seguintes motivos: mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário pelo partido ou grave discriminação política pessoal. De toda sorte, destaca-se o risco de tal postura, tendo em vista o rigor da Justiça Eleitoral na caracterização das hipóteses de justa causa.

Quanto à hipótese da discriminação pessoal, houve substancial modificação. Antes, falava-se em grave discriminação pessoal, ao passo que agora a norma prevê a grave discriminação política pessoal. Sendo assim, o legislador empenhou-se em superar a resistência da Justiça Eleitoral em aceitar as divergências políticas internas, no seio partidário, como motivo suficiente para mudança de partido.

Em regra, os órgãos julgadores da Justiça Eleitoral afirmavam que as divergências partidárias seriam próprias do ambiente político, negando o reconhecimento da justa causa. Assim, com a atual norma, que especifica a natureza política da discriminação investigada, tal resistência diminuirá.
Mas e a justa causa consistente na “criação de novo partido”? Observem que tal hipótese não foi prevista pela Lei nº 13.165/15, de modo que tal fato implicará uma cuidadosa reflexão sobre a Resolução do TSE nº 22.610/07 à luz da nova lei, afinal de contas, se resolução tem o propósito (ou ao menos deveria ser assim) de apenas garantir fiel execução à legislação eleitoral, sem criar nem restringir direitos, como admitir a permanência da criação de novo partido como hipótese de justa causa quando a legislação optou por não considerá-la quando disciplinou o tema?

O momento é de meditação sobre o Direito Eleitoral, de compreender o alcance das inovações realizadas pela minirreforma eleitoral. E nessa missão de fazer ciência valem mais as interrogações do que os pontos finais. Ou não é assim?

Tiago Ayres é advogado, mestre em Direito Público pela UFBA, professor da Pós-graduação em Direito Público da Faculdade Baiana de Direito e sócio do Escritório Ayres e Catelino Advogados Associados. Ele escreve às terças-feiras no Toda Bahia sobre temas relevantes do Direito. E-mail: tiago.ayres@gmail.com

06 de outubro de 2015, 13:40

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