quinta-feira, 25 de abril de 2024

A PEC é tudo, menos da bengala – por Tiago Ayres

Nunca antes na história deste país uma bengala causou tanto frenesi. Tal qual aquela que sustentou por muito tempo o genial Charlie Chaplin, a “PEC da Bengala” invadiu as telas,  conquistou audiência, e, guardadas as devidas proporções, marcou uma época: a do menosprezo ao republicanismo.

O que precisa, de logo, ser dito, é que essa proposta de emenda à Constituição Federal pode ser tudo, menos da bengala. Se queriam estigmatizá-la ao fazer dela sinônimo de mero apoio a quem, pelo inexorável passar do tempo, já estaria cambaleante e com a força de trabalho comprometida, erraram feio. E mais do que isso, perderam a oportunidade de revelar os verdadeiros equívocos dessa proposta.

A idade não é o problema, sendo até mesmo solução.  Daí porque inapropriada a expressão “PEC da Bengala”. Não se tem dúvida da alta capacidade de trabalho e de criação de inúmeros ministros que, embora tenham sido aposentados compulsoriamente, ao atingirem 70 anos, poderiam continuar a judicar, haja vista o seu largo tirocínio profissional.

Quem em sã consciência ousaria dizer que o ministro Carlos Ayres Britto, aposentado no auge do julgamento do “mensalão” não poderia continuar na labutar até os 75 anos? Hoje, aliás, é um dos mais ativos e requisitados pareceristas do Brasil. O mesmo poder-se-ia dizer de Celso de Mello e de outros tantos.

Vejam, portanto, que a discussão não deve ocorrer sob a estreita perspectiva da idade. Aos 75anos, sobretudo com o aumento da expectativa de vida do brasileiro, esses operadores do Direito assomam à sua perfeita saúde uma bagagem de vida sem igual, sendo a sabedoria um ingrediente que os destaca dos demais.

O que se deve repugnar nessa proposta de emenda é o seu casuísmo, com a prefixação de um claro alvo desde a sua concepção, qual seja, minar as possibilidade da atual presidente da República reeleita nomear mais 6 (seis) ministros do STF.

Na ultima sexta-feira (08/05), na cerimônia de outorga do título de cidadão baiano, ocorrida na Assembleia Legislativa da Bahia, o próprio ministro aposentado do STF, Carlos Ayres, que poderia ter sido beneficiado com a PEC, caso tivesse sido promulgada em 2012, criticou a medida ao afirmar que “No fundo, eu não gosto muito de ver membro do Poder, com o exercício do seu cargo prorrogado. Eu acho mais republicano chegar naquele limite que existia quando você se investiu nele, no cargo”, pontuou.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e também a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) reafirmaram posição contrária à denominada “PEC da Bengala”.

A questão fundamental não diz respeito à plenitude ou limitações de quem atinge 70 ou 75 anos para seguir na elevada missão de decidir as demandas cujos efeitos são os mais complexos e impactantes na vida nacional.

O que assombra é o casuísmo da PEC. Por meio dela busca-se tolher um direito que é garantido pela Constituição Federal à presidente da República, sendo que qualquer alteração somente deveria ter efetiva aplicação para a aposentadoria dos próximos ministros que viessem a ser nomeados após a entrada em vigor da nova norma constitucional.

A verdade é que se existe uma bengala essa não é para sustentar julgadores fragilizados e intelectualmente limitados por mais 5 anos nos tribunais, mas sim para dar sustentação a uma manobra covarde e nada republicana de subitamente alterar as regras do jogo democrático, custe o que custar.

Tiago Ayres é advogado, mestre em Direito Público pela UFBA, professor da Pós-graduação em Direito Público da Faculdade Baiana de Direito e sócio do Escritório Ayres e Catelino Advogados Associados. Ele escreve às terças-feiras no Toda Bahia sobre temas relevantes do Direito. E-mail: tiago.ayres@gmail.com

12 de maio de 2015, 01:00

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