quinta-feira, 25 de abril de 2024

A mini, porém, polêmica, reforma eleitoral – por Tiago Ayres

A Câmara dos Deputados concluiu na quarta-feira (9/09/15) a votação da minirreforma eleitoral, resposta da Casa Legislativa às demandas cada vez mais contundentes da sociedade brasileira, que tem revelado, de há muito, descontentamento com a forma de se fazer política no Brasil.

Em meio ao clima de combate à corrupção, sempre vinculado ao impacto e efeitos da Operação “Lava Jato”, o Congresso esforça-se para não figurar como mero coadjuvante nesse processo de moralização, fazendo de tudo para que a sociedade credite ao Parlamento alguma contribuição para o fortalecimento da democracia por meio de ajustes no processo eleitoral. O projeto de lei 5.735/13, que rejeita a maioria das emendas do Senado, estabeleceu, dentro outras, as seguintes alterações, que podem ser vistas como as mais polêmicas:

RESTRIÇÃO ÀDOAÇÃO DE EMPRESAS A PARTIDOS POLÍTICOS

Além do limite de doação já previsto na lei atual, de até 2% do faturamento bruto da empresa no ano anterior à eleição, o texto da lei que introduziu a minirreforma eleitoral disciplina que o total das doações poderá alcançar até R$ 20 milhões, sendo que em hipótese alguma a doação para um único partido poderá ultrapassar 0,5% desse faturamento, evitando-se, assim, a concentração de recursos em poucas agremiações partidárias.

Caso haja a inobservância dessas limitações, a empresa será multada em cinco vezes a quantia em excesso e estará sujeita à proibição de participar de licitações públicas e de celebrar contratos com o poder público por cinco anos por determinação da Justiça eleitoral.

A Superveniente decisão do STF quanto ao financiamento privado de campanhas eleitorais.

Ocorre que, apesar de todos os ajustes realizados pela Câmara dos Deputados, que parece ter chegado a um ponto de equilíbrio para conter os abusos e desvirtuamentos dos financiamentos privados das campanhas eleitorais, sem, contudo, extirpá-los, o Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 17 de setembro, pelo placar de 8 votos a 3, impôs a proibição ao financiamento empresarial, o que já deverá ser aplicado para as eleições municipais do ano que vem.

Com a decisão do STF, qualquer deliberação por lei ordinária, relacionada ao financiamento eleitoral por empresa, torna-se automaticamente inconstitucional, conforme já se manifestaram publicamente ministros da Corte Suprema.

Daí porque certamente será mais confortável para a presidente Dilma vetar os trechos do projeto de lei sobre doações empresariais. Segundo noticiado nesses últimos dias pela imprensa, algumas lideranças mais chegadas à presidente, afirmam que ela já tinha o propósito de barrar a questão do financiamento. Com o respaldo do entendimento do STF a tarefa da presidente parece ter ficado menos espinhosa.

REDUÇÃO DO PRAZO DE FILIAÇÃO PARTIDÁRIA

Outro ponto da reforma que tem gerado significativa polêmica diz com a diminuição do prazo mínimo de filiação a um partido para que o eleitor possa pleitear o seu registro de candidatura. Pela minirreforma eleitoral, tal prazo deixa de ser de um ano, passando para seis meses.

Muitos apontaram para o que seria uma possível inconstitucionalidade de tal alteração, com o que, entretanto, não concordamos.

A Constituição Federal não estabelece prazo mínimo de filiação partidária, apenas exigindo, em seu art. 14, § 3º, V, a filiação partidária como condição de elegibilidade, mas sem qualquer menção a prazo. O prazo mínimo de um ano é previsto nas Leis 9.504/97, art. 9º, e na Lei 9.096/95, art. 18. Evidente, portanto, que por ser matéria disciplinada por lei ordinária, não há que se falar em eventual inconstitucionalidade da redução de tal marco temporal por lei da mesma natureza.

JANELA MIGRATÓRIA

Por fim, merece ainda reflexão a introdução na minirreforma da autorização para, dentro dos 30 (trinta) dias que antecedem o novo prazo de seis meses para filiação, poder o eleitor mudar de partido sem que, caso ocupe cargo eletivo, o perca por infidelidade partidária, conforme hoje prevê a Resolução do Tribunal Superior Eleitoral de nº 22.610/07.

Nada há de inconstitucional em tal disciplina. Temos defendido há muito tempo que não é possível confundir-se fidelidade partidária com aprisionamento partidário.

Enquanto estiver no exercício do cargo eletivo, salvo se houver justa causa para a mudança, deverá o eleitor observar o seu dever de fidelidade ao partido originário. Todavia, não é a opção legal de migrar de partido nos trinta dias anteriores ao prazo mínimo de filiação que comprometerá o instituto da fidelidade partidária.

Por outro lado, não podemos deixar de registrar que a própria hipótese de perda de cargo eletivo por infidelidade, prevista em resolução do TSE, é de insuperável inconstitucionalidade. Onde a Constituição silenciou não é dado a ninguém falar por ela, muito menos por resolução que apenas tem o propósito de garantir execução à legislação eleitoral, não podendo inovar, nem muito menos restringir direitos.

Tiago Ayres é advogado, mestre em Direito Público pela UFBA, professor da Pós-graduação em Direito Público da Faculdade Baiana de Direito e sócio do Escritório Ayres e Catelino Advogados Associados. Ele escreve às terças-feiras no Toda Bahia sobre temas relevantes do Direito. E-mail: tiago.ayres@gmail.com

22 de setembro de 2015, 10:00

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